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CONSTRUÇÃO DE CONSENSO – SEMINÁRIOS TEMÁTICOS

CONSTRUÇÃO DE CONSENSO – SEMINÁRIOS TEMÁTICOS

Focalização, Sinergia & Construção de Consenso para Projetos Temáticos

Jan N. Bronson, M.A., NCRPsyA.
24 de Fevereiro de 2004
[email protected]

Tradução: Prof. Ms. João Carlos Caselli Messias

INTRODUÇÃO

A Construção de Consenso é um dos métodos para processos de tomada de decisão assim como outros, mas não limitado à votação, debate ou direcionamento a partir de uma autoridade. O processo de Construção de Consenso pode ser útil quando outras formas de tomada de decisão ou resolução de conflitos emperram, ou quando o consenso, como um método, pode prover um resultado mais poderoso e melhor apoiado do esforço do grupo, de modo a faze-lo deslanchar. É um método em que o processo facilita o conteúdo.

O processo depende de que cada participante veja os outros como iguais, de que cada um tenha uma atitude de respeito aos pontos de vista dos outros, mesmo que não concorde com eles. Depende da vontade e compromisso em manter as “regras” do processo (página 3) e da capacidade de cada participante em ouvir, bem como falar.

De modo simples, este processo de Construção de Consenso pede aos participantes que foquem apenas no acordo. Assim sendo, não se utiliza debate, nem votações e nem diretividade. Os Participantes argumentam, os Participantes ouvem e os Participantes manifestam quanto concordam com o que foi apresentado. O acordo pode se dar com algo pequeno como uma palavra, uma cláusula, um adjetivo ou com algo maior, como uma colocação ou uma proposta. Quando uma idéia é apresentada, os demais podem completá-la, modificá-la ou não responder a ela. Trabalha-se em uma idéia por vez. O objetivo é alcançar um consenso que congregue e reflita a contribuição de todos os membros.

A construção a partir da concordância se torna a fundação para a solução criativa de um conflito. A solução pode ser uma afirmação, uma opinião, um artigo, uma resolução ou uma proposta de ação específica. Pelo fato deste processo limitar a interação restritamente ao acordo, uma energia particularmente criativa é liberada e encorajada. Freqüentemente os participantes incentivam a pessoa que está apresentando uma idéia ou opinião a ir adiante, com colocações e questões como “O que poderia acontecer se ----“, “Você poderia falar mais sobre aquele aspecto em específico?”, “Você poderia aprofundar esse raciocínio?”.

Estou revivendo e revisando o processo de Construção de Consenso que desenvolvi em seminários no final dos anos 60 e início dos anos 70 na Universidade de Colúmbia, com o intuito de explorar como esse processo pode ser útil quando aplicado hoje em dia em vários contextos focados em temas. Além dos grupos orientados por questões político-sociais, ele pode ser aplicado à terapia familiar e de casais, organizações comunitárias, organizações de negócios e reuniões para resolução de problemas.

Neste momento estou acrescentando a esta forma de Construção de Consenso um processo intitulado Focalização, que foi desenvolvido pelo Dr. Eugene Gendlin, quando professor da Universidade de Chicago. A Focalização é um processo que integra o saber mental com o saber corporal e, na minha experiência, amplifica o método de Construção de Consenso.

HISTÓRIA: ESTUDOS INTERCULTURAIS NA UNIVERSIDADE DE COLÚMBIA, 1966 – 1974

A Construção de Consenso foi aplicada no final dos anos 60 e início dos anos 70 na forma de Seminários Interculturais e Projetos de Ação Comunitária, como parte do Programa de Estudos Interculturais em Earl Hall, Centro de Vida Religiosa na Universidade de Colúmbia. Houve resultados impressionantes e surpreendentes. Uma variedade de seminários focados em questões político-sociais. Alguns dos tópicos incluíam: resolução de conflitos no Oriente Médio, apartheid na África do Sul, desenvolvimento econômico rural na Jamaica, Índias Ocidentais, direitos dos Aborígines na Austrália, Direitos das mulheres na Ásia Oriental, Fórum Juvenil das Nações Unidas.

Estes seminários, para os quais a inscrição era voluntária, envolviam estudantes dos países em discussão e muitos outros, incluindo os Estados Unidos. Eles representavam não apenas diferentes culturas, mas também diferentes áreas de estudo e diferentes orientações de valores. O número de participantes era limitado a 10 ou 12. Alguns seminários tiveram 4 membros, porém esse número não diminuiu os resultados. A língua comum era o Inglês, entretanto havia cuidado em esclarecer conceitos e significados que poderiam ter interpretações culturais diferentes.

O desafio desses grupos de seminários era o de encontrar acordo para uma proposta ou resolução utilizando a diversidade cultural e acadêmica dos membros. Os resultados desses processos foram significativos em alguns casos.

Um seminário dirigia-se à pobreza no terceiro mundo e focava a Jamaica, nas índias Ocidentais. O projeto Jamaica, índias Ocidentais, contemplava a pobreza rural e a desigualdade econômica de muitas mulheres de lá. Do seminário resultou o desenvolvimento de uma indústria que produz queijo feito de leite de fazendas na Jamaica. A preferência era dada às mulheres assalariadas que tinham pouca chance de complementar a renda familiar de outras maneiras; na Jamaica, muitas mulheres trabalham em fazendas. Hoje esse projeto tornou-se uma indústria produtora de queijo chamada THREE-M Cheese Making & Dairy Improvement Project.

O seminário sobre o Oriente Médio focava o conflito Israel – Palestina. Eles definiram um passo para ação que pode ter resultado na eventual construção de um centro, nessa área, responsável por proporcionar treinamento em cuidados com a saúde, engenharia, agricultura, tecnologia de informática e outros serviços. O plano consistia em levantar fundos e construir um centro organizado, dirigido em conjunto por Israelenses e Palestinos, que dariam treinamento nessas áreas vistas como necessidades mútuas e fundamentais. Pensou-se que refletir sobre essas necessidades como uma empreitada comum de Israelenses e Palestinos poderia ser uma maneira de construir relacionamentos positivos que poderiam surtir efeitos no processo de paz.

Ainda que os tópicos do seminário fossem específicos para áreas político geográficas, os estudantes de países outros que não esses em discussão estariam aptos a adaptar e aplicar certas propostas em suas próprias situações “caseiras”.

O projeto de Ação Comunitária era também parte do Programa de Estudos Interculturais da Universidade de Colúmbia e empregou a Construção de Consenso em seu trabalho voluntário com comunidades da cidade de Nova Iorque. Este grupo tinha como seu foco o envolvimento dos estudantes internacionais da Universidade de Colúmbia, dos membros do corpo docente e da comunidade em alguns dos assuntos mais urgentes da vizinhança, incluindo desemprego (treinamento para o trabalho), programas “depois das aulas” para crianças em idade escolar, problemas de moradia (estudantes de arquitetura trabalhavam com organizações comunitárias), alfabetização (tutoria). Um programa atual da Earl Hall chamado de Impacto Comunitário dedica-se a alguns desses assuntos da cidade.

Sinergia é um conceito ativamente aplicado por Buckminster (Bucky) Fuller, o arquiteto que, entre outras realizações, concebeu a Cúpula Geodésica. Sua filosofia (a qual ele aplicou à cúpula) é: “enquanto as partes contribuem com o todo, o todo não é meramente a soma das partes”. Foi este conceito que me inspirou a organizar os seminários de Construção de Consenso. Cada participante é valorizado igualitariamente como um membro que tem uma contribuição válida a oferecer em direção ao consenso. Já que o consenso será algo diferente da soma das contribuições individuais, ainda assim a contribuição de cada membro pode ser reconhecida em alguma medida no resultado. O resultado não pode ser pré-determinado; ao contrário, ele se desenvolve a partir do próprio processo de interação.

Quando a diversidade cultural e acadêmica é honrada como uma fonte de resolução de problemas, então o diálogo nesse ponto de encontro pode ter a sinergia que realça a criatividade e o pensamento intelectual.

O processo de Construção de Consenso em si mesmo teve valor em proporcionar aos seus participantes uma experiência intercultural autêntica na qual os participantes vincularam-se com sinergia. Eles puderam experienciar o que eles dividiram; o que foi partilhado através do foco na concordância encorajaram um nível de pensamento criativo, intelectualizado e comunitário que foi marcante em diversos aspectos. Ele atravessou a diferença e encontrou a comunhão e isso se tornou o pilar para “o que pode ser feito”. De fato, o grau de diversidade de um grupo pode efetivamente realçar e ampliar o grau de criatividade do resultado final.

 

AS REGRAS

  1. A pessoa traz uma atitude de não julgamento ao seminário.
  2. Ouvir é participar ativamente.
  3. Cinco minutos de Focalização silenciosa iniciam o seminário, para que os participantes possam clarificar pensamentos e sentimentos a respeito do tópico.
  4. Qualquer participante pode iniciar com uma colocação. Fala uma pessoa por vez.
  5. Os participantes respondem apenas àquilo com os quais concordam. Pode ser uma palavra, uma cláusula, uma afirmação inteira. Suas respostas podem completar ou modificar a colocação proposta. Perguntas são bem vindas.
  6. Participantes que não concordam com qualquer parte da apresentação não falam. Se ninguém concordar com o que está sendo oferecido, após dois minutos alguém pode oferecer outra idéia, etc.
  7. Quando a proposta de um participante não for adotada, e essa pessoa sentir que sua proposta tem validade, pode anota-la para outra ocasião.

O PROCESSO

  1. Uma pessoa é o facilitador, que zela pelas regras, evita a discussão negativa, observa a estrutura de tempo e encoraja o processo.
  2. Um dos participantes anota os Pontos de Consenso e o Consenso Final. Essa pessoa também presta atenção a quando um Ponto de Consenso é alcançado. Por exemplo, um Ponto de Consenso no seminário sobre o Oriente Médio era o de que a resposta política não era, na época, a solução. Todos os participantes concordavam com isso. O processo, então, moveu-se para outras opções. Uma solução militar também foi descartada. Esses Pontos de Consenso levaram a um Consenso Final: um centro de treinamento Israelita – Palestino para ensinar sobrevivência básica, saúde, educação, treinamento para o trabalho, distribuição de gêneros alimentícios. O seminário sobre a Jamaica chegou a um Ponto de Consenso de que, para o crescimento econômico na Jamaica, seria necessário refletir seriamente sobre a pobreza e a condição econômica problemática de muitas mulheres de lá. Esse Ponto de Consenso moveu-se para um Consenso Final que implicava no uso da indústria rural, das fazendas ?????? para o desenvolvimento de uma indústria para fabricação de queijo.
  3. O Consenso Final pode ser uma proposta, uma opinião, um plano de ação, uma colocação de um fato ou uma resolução.
  4. O processo de Focalização permite a cada participante estar conectado com sua interna sensação sentida e manter a conexão mente-corpo ao longo da discussão. A Focalização é aplicada no início e em qualquer momento durante a discussão, especialmente quando esta fica patinando ou quando um participante precisa de tempo para considerar um tópico. Ao final da reunião, a Focalização oferece a cada participante tempo para refletir sobre sua experiência nesse processo, sobre o consenso final, em suas idéias que não foram adotadas pelo grupo e em um próximo passo.
  5. Após o Consenso Final, pode ser apropriado acrescentar mais dois focos de Consenso: um plano de ação, e o que poderia se colocar no caminho da implementação do plano de ação.

 

EM RESUMO

Há três fases nesta forma de Construção de Consenso / Projetos Temáticos. Entretanto, muitos projetos são concebidos apenas para contemplar a primeira fase: identificação de acordo sobre um assunto. As três fases são: identificação do assunto, identificação do plano de ação e identificação do que pode se colocar no caminho do plano de ação.

Os participantes precisam trazer papel, caneta, suas idéias, uma atitude de não julgamento, habilidade de boa escuta e um desejo de se engajar nesse processo, que freqüentemente desafia a habilidade de evitar entrar em discussões negativas e desacordo.

FOCALIZAÇÃO E CONSTRUÇÃO DE CONSENSO

A Focalização parece ser um acréscimo natural a este processo. A aplicação da Focalização no início da discussão permite a cada participante saber e manter-se em contato com sua perspectiva, sua sensação sentida e pensamentos a respeito do assunto. Pelo fato de que a contribuição individual é estratégica para o resultado, a Focalização pode ser a ferramenta que faz isso acontecer. A Focalização também pode ser usada ao longo da discussão de forma a que os participantes possam ter momentos de “espere um pouco”, para verificar sua sensação sentida a respeito do que está sendo considerado. Mary Hendricks, no Focusing Newsletter escreveu sobre isso em seu artigo “Focusing as a force for peace: the revolutionary pause” (Staying in Focus – The Focusing Institute Newsletter, Volume III, #2, May, 2003).